WEBER, Max (1864-1920). A Ética Protestante e o Espírito do
Capitalismo. 11ªed. São Paulo: Pioneira, 1995.
Por Ricardo de Moura Borges ( professor de filosofia).
A presente obra apresenta as transformações
sociais existentes a partir do início da modernidade, justificando o surgimento
do trabalho e suas implicações frente as vertentes da hegemonia predominante
que passa a adquirir rupturas, desde o processo de fragmentação com o
surgimento do protestantismo na Europa. Publicada no ano de 1905 encontramos
uma relação entre condutas religiosas e política. A obra está dividida em: I O
problema sendo subdividido nos seguintes tópicos: a) filiação Religiosa e
Estratificação Social; b) O “Espírito” do Capitalismo; e c) A Concepção de
Vocação de Lutero; tarefa da investigação. II A Ética Vocacional do
Protestantismo Acético, sendo subdivido nos seguintes temas: Fundamentos
Religiosos do Ascetismo Laico: a) o Calvinismo; b) o Pietismo; c) O Metodismo;
d) As seitas batistas; e por fim, Ascese e o Espírito do Capitalismo.
Terminando definitivamente com Notas do autor e um índice reminissivo.
Entender a proposta de Max Weber sobre a
presente obra em destaque nos faz refletir sobre seu conceito ou abstração da
realidade a partir de pontos subjetivos, tendo em vistas que o ser humano para
o autor não pode abstrair a concretude do todo, mas fragmentos daquilo que se
apresenta a partir da realidade demonstrada. Parece kantiana a reflexão,
contudo percebemos como a fundamentação fenomenológica faz parte de seu método
ou proposição investigativa. A realidade que é desprovida de sentido, faz-se
necessário portanto que o sujeito de sentido a realidade externa. Também aqui
entendemos que sua proposta acabou influenciando a perspectiva filosófica
existencialista, onde, por exemplo, temos Camus com a seguinte máxima “A vida
não tem sentido, cabe o sujeito dar sentido a sua própria existência”.
Enfim, temos uma interessante abordagem na
introdução dessa edição da Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais que reafirma
o pensamento do autor sobre a hegemonia da razão na região ocidental, dado de “um
desenvolvimento universal, em seu valor e significado”. E assim perpassamos
pelo entendimento dos conceitos criados pelo autor para entendermos a lógica do
capitalismo frente ao avanço do protestantismo, como destaque de que em sua análise
sociológica percebemos que todos os países de cunho protestante, tenderam a
desenvolver mais intensamente o novo sistema que se impunha frente as mudanças
sociais da modernidade, tendo destaque a linha calvinista que “ ao que parece,
das mais fortes, inclusive na Alemanha e a religião “ reformada” mais do que
outras, parece ter promovido o desenvolvimento do espírito do capitalismo”.
É interessante destacar que encontramos a
reflexão sobre a participação dos protestantes nos postos mais elevados de
trabalho, o que mostra um fato até então contraditório por causa do pensamento
hegemônico tradicional, que passa a ser aliado, ou seja, temos a relação entre
religiosidade capitalismo. O tal conceito de trabalho que era justificado como
um castigo de Deus, associado aos conceitos gregos e de outras civilizações
como algo penoso, lembramos do tripallium, instrumento de tortura do qual
derivou o nome trabalho, e que sobre a perspectiva do protestantismo nascente,
principalmente do calvinismo, entendemos que aquele que trabalha é abençoado
pelo Senhor. Claro que existem as diferenças, tendo em vista que o capitalista
procura desenfreadamente o lucro para garantir a ostentação dos bens
adquiridos, ou seja da riqueza, já o protestante procura trabalhar sempre mais
para ser abençoado pelo Senhor, contudo deve viver na frugalidade e de forma
humilde sem apresentar as riquezas de forma excepcional ou estrambólica. Assim,
forma-se uma nova ética, ou seja, um ethos que forma um jeito de ser e de viver
numa sociedade especifica.
Tanto o protestante quanto o capitalista tem
algo em comum: uma vida em sociedade que seja baseada fundamentalmente no
trabalho e no lucro. Para o protestante deve-se viver na perspectiva de que o
trabalho nos moldes do espirito de salvação divina, e para o capitalista
deve-se viver nos moldes de obtenção desenfreado do lucro. Um elemento
interessante é a doutrina da predestinação que vai ganhando corpo, no sentido
que é o sujeito que sente a presença do Senhor, como escolhido, e tendo em
vista que se for abençoado materialmente, pelo seu esforço do trabalho, tem a
confirmação da salvação do Senhor.
O trabalho acaba ganhando um fim em si mesmo.
A sua finalidade não necessariamente está no salário que o sujeito quer ganhar
mas, no exercício de uma atividade digna (se você não tem trabalho você não é
digno), e moralmente aceita. Numa sociedade em constante transformação marcada
pelo desenvolvimento constante encontramos a educação como elemento fundante
que passa a ser a mola propulsora para a fundamentação social do pensamento
capitalista.
Temos dessa forma, o processo religioso
(protestante) e a educação que formam o indivíduo em um jeito de ser e de viver
que dão bases solidas para o espírito do capitalismo. Pois o capitalismo
valoriza o trabalho como a base de organização e funcionamento da sociedade.
Desse modo, entendemos na perspectiva weberiana de que o espirito do
capitalismo moderno, está fundamentado numa diferenciação dos sujeitos empreendedor
do trabalhador protestante e do empreendedor da modernidade. Ambos tem em mente
que o trabalho é algo absoluto, onde para o empreendedor protestante seu
espírito está moldado na busca de modéstia de suas atitudes, enquanto o
empreendedor moderno busca o reconhecimento social.
Na perspectiva weberiana a ação social, que é
de cunho fenomenológico está configurada por vários fatores, dentre os quais
destacamos: a ação afetiva, onde o sujeito é impulsionado por afetos ou estados
emocionais. Por exemplo, quando recebemos um elogio ou uma crítica (principalmente
não construtiva de alguém), levando ou a atração ou a repulsa. Diferentemente
dos outros sociólogos clássicos, encontramos em Weber um poder muito grande da
subjetividade do sujeito, mesmo estando imbuído em uma sociedade marcada pelo
materialismo histórico (Marx), e do fato social (Durkheim). A ação racional
baseada ou orientada (direcionada) a fins: o sujeito projeta uma finalidade a
ser obtida, então planeja, calcula. Por exemplo, um estudante do curso de
mestrado profissional em sociologia, traça metas, planos e objetivos para poder
encerrá-lo com êxito. A ação racional relacionada a valores: mesmo sendo
racional, o sujeito move-se de acordo com valores encontrados ou em um grupo
social, ou nas instituições encontradas. A exemplo, alguém pode defender um
partido político x ou y, mesmo que exista corrupção, fraude ou escando, mas o
sujeito pode muito bem movido pelos valores, pertencentes a construção do
partido, alegar que quem cometeu determinada infração foram os sujeitos e não
afeta os valores intrínsecos ao partido. Outro exemplo, poderia ser o time de
futebol especifico que move multidões em uma partida. Por fim, temos a ação
tradicional, onde somos movidos por aquilo que aprendemos da cultura herdada de
gerações antigas: “sempre foi assim, portanto, agirei assim”, a forma de se
vestir, os comportamentos nas instituições, por exemplo, a forma de fileiras
nas escolas em sala de aula, etc.
Merece destaque também a questão do ascetismo
religioso, como vimos acima, o protestante, por exemplo, mesmo provido de
muitos bens materiais, vê e sente o trabalho como objeto total de vida, mas o
seu modo de vida deve ser marcado pela austeridade.
No processo de industrialização e
desenvolvimento da sociedade capitalista aparecem os meios burocráticos, onde a
complexidade nas relações sociais aumenta. Essa burocratização está relacionada
a um processo de racionalização onde o Estado Moderno coloca-se como meio de
garantir a “legalidade”, estabelecendo leis, normas e punições a aqueles que
não cumprirem essa legalidade. O problema que a racionalização da vida moderna,
causa um desencantamento do mundo, onde o sujeito agora movido por objetivos e
vendo o trabalho como uma vocação necessária, perde o encantamento magico do
mundo, visto e vivido pelos sujeitos na idade média. Essa mola propulsora do
trabalho como uma vocação acarreta necessariamente ao racionalismo econômico,
onde como vimos, o racional é movido a fins capitalistas.
Nos encontramos na próxima resenha de livros, pois Ler é o Caminho!
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