domingo, 13 de maio de 2018

A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. É Hora de Ler - 11 . 2018

WEBER, Max (1864-1920). A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. 11ªed. São Paulo: Pioneira, 1995.

Por Ricardo de Moura Borges ( professor de filosofia).



A presente obra apresenta as transformações sociais existentes a partir do início da modernidade, justificando o surgimento do trabalho e suas implicações frente as vertentes da hegemonia predominante que passa a adquirir rupturas, desde o processo de fragmentação com o surgimento do protestantismo na Europa. Publicada no ano de 1905 encontramos uma relação entre condutas religiosas e política. A obra está dividida em: I O problema sendo subdividido nos seguintes tópicos: a) filiação Religiosa e Estratificação Social; b) O “Espírito” do Capitalismo; e c) A Concepção de Vocação de Lutero; tarefa da investigação. II A Ética Vocacional do Protestantismo Acético, sendo subdivido nos seguintes temas: Fundamentos Religiosos do Ascetismo Laico: a) o Calvinismo; b) o Pietismo; c) O Metodismo; d) As seitas batistas; e por fim, Ascese e o Espírito do Capitalismo. Terminando definitivamente com Notas do autor e um índice reminissivo.
Entender a proposta de Max Weber sobre a presente obra em destaque nos faz refletir sobre seu conceito ou abstração da realidade a partir de pontos subjetivos, tendo em vistas que o ser humano para o autor não pode abstrair a concretude do todo, mas fragmentos daquilo que se apresenta a partir da realidade demonstrada. Parece kantiana a reflexão, contudo percebemos como a fundamentação fenomenológica faz parte de seu método ou proposição investigativa. A realidade que é desprovida de sentido, faz-se necessário portanto que o sujeito de sentido a realidade externa. Também aqui entendemos que sua proposta acabou influenciando a perspectiva filosófica existencialista, onde, por exemplo, temos Camus com a seguinte máxima “A vida não tem sentido, cabe o sujeito dar sentido a sua própria existência”.
Enfim, temos uma interessante abordagem na introdução dessa edição da Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais que reafirma o pensamento do autor sobre a hegemonia da razão na região ocidental, dado de “um desenvolvimento universal, em seu valor e significado”. E assim perpassamos pelo entendimento dos conceitos criados pelo autor para entendermos a lógica do capitalismo frente ao avanço do protestantismo, como destaque de que em sua análise sociológica percebemos que todos os países de cunho protestante, tenderam a desenvolver mais intensamente o novo sistema que se impunha frente as mudanças sociais da modernidade, tendo destaque a linha calvinista que “ ao que parece, das mais fortes, inclusive na Alemanha e a religião “ reformada” mais do que outras, parece ter promovido o desenvolvimento do espírito do capitalismo”.
É interessante destacar que encontramos a reflexão sobre a participação dos protestantes nos postos mais elevados de trabalho, o que mostra um fato até então contraditório por causa do pensamento hegemônico tradicional, que passa a ser aliado, ou seja, temos a relação entre religiosidade capitalismo. O tal conceito de trabalho que era justificado como um castigo de Deus, associado aos conceitos gregos e de outras civilizações como algo penoso, lembramos do tripallium, instrumento de tortura do qual derivou o nome trabalho, e que sobre a perspectiva do protestantismo nascente, principalmente do calvinismo, entendemos que aquele que trabalha é abençoado pelo Senhor. Claro que existem as diferenças, tendo em vista que o capitalista procura desenfreadamente o lucro para garantir a ostentação dos bens adquiridos, ou seja da riqueza, já o protestante procura trabalhar sempre mais para ser abençoado pelo Senhor, contudo deve viver na frugalidade e de forma humilde sem apresentar as riquezas de forma excepcional ou estrambólica. Assim, forma-se uma nova ética, ou seja, um ethos que forma um jeito de ser e de viver numa sociedade especifica.
Tanto o protestante quanto o capitalista tem algo em comum: uma vida em sociedade que seja baseada fundamentalmente no trabalho e no lucro. Para o protestante deve-se viver na perspectiva de que o trabalho nos moldes do espirito de salvação divina, e para o capitalista deve-se viver nos moldes de obtenção desenfreado do lucro. Um elemento interessante é a doutrina da predestinação que vai ganhando corpo, no sentido que é o sujeito que sente a presença do Senhor, como escolhido, e tendo em vista que se for abençoado materialmente, pelo seu esforço do trabalho, tem a confirmação da salvação do Senhor.
O trabalho acaba ganhando um fim em si mesmo. A sua finalidade não necessariamente está no salário que o sujeito quer ganhar mas, no exercício de uma atividade digna (se você não tem trabalho você não é digno), e moralmente aceita. Numa sociedade em constante transformação marcada pelo desenvolvimento constante encontramos a educação como elemento fundante que passa a ser a mola propulsora para a fundamentação social do pensamento capitalista.
Temos dessa forma, o processo religioso (protestante) e a educação que formam o indivíduo em um jeito de ser e de viver que dão bases solidas para o espírito do capitalismo. Pois o capitalismo valoriza o trabalho como a base de organização e funcionamento da sociedade. Desse modo, entendemos na perspectiva weberiana de que o espirito do capitalismo moderno, está fundamentado numa diferenciação dos sujeitos empreendedor do trabalhador protestante e do empreendedor da modernidade. Ambos tem em mente que o trabalho é algo absoluto, onde para o empreendedor protestante seu espírito está moldado na busca de modéstia de suas atitudes, enquanto o empreendedor moderno busca o reconhecimento social.
Na perspectiva weberiana a ação social, que é de cunho fenomenológico está configurada por vários fatores, dentre os quais destacamos: a ação afetiva, onde o sujeito é impulsionado por afetos ou estados emocionais. Por exemplo, quando recebemos um elogio ou uma crítica (principalmente não construtiva de alguém), levando ou a atração ou a repulsa. Diferentemente dos outros sociólogos clássicos, encontramos em Weber um poder muito grande da subjetividade do sujeito, mesmo estando imbuído em uma sociedade marcada pelo materialismo histórico (Marx), e do fato social (Durkheim). A ação racional baseada ou orientada (direcionada) a fins: o sujeito projeta uma finalidade a ser obtida, então planeja, calcula. Por exemplo, um estudante do curso de mestrado profissional em sociologia, traça metas, planos e objetivos para poder encerrá-lo com êxito. A ação racional relacionada a valores: mesmo sendo racional, o sujeito move-se de acordo com valores encontrados ou em um grupo social, ou nas instituições encontradas. A exemplo, alguém pode defender um partido político x ou y, mesmo que exista corrupção, fraude ou escando, mas o sujeito pode muito bem movido pelos valores, pertencentes a construção do partido, alegar que quem cometeu determinada infração foram os sujeitos e não afeta os valores intrínsecos ao partido. Outro exemplo, poderia ser o time de futebol especifico que move multidões em uma partida. Por fim, temos a ação tradicional, onde somos movidos por aquilo que aprendemos da cultura herdada de gerações antigas: “sempre foi assim, portanto, agirei assim”, a forma de se vestir, os comportamentos nas instituições, por exemplo, a forma de fileiras nas escolas em sala de aula, etc.
Merece destaque também a questão do ascetismo religioso, como vimos acima, o protestante, por exemplo, mesmo provido de muitos bens materiais, vê e sente o trabalho como objeto total de vida, mas o seu modo de vida deve ser marcado pela austeridade.
No processo de industrialização e desenvolvimento da sociedade capitalista aparecem os meios burocráticos, onde a complexidade nas relações sociais aumenta. Essa burocratização está relacionada a um processo de racionalização onde o Estado Moderno coloca-se como meio de garantir a “legalidade”, estabelecendo leis, normas e punições a aqueles que não cumprirem essa legalidade. O problema que a racionalização da vida moderna, causa um desencantamento do mundo, onde o sujeito agora movido por objetivos e vendo o trabalho como uma vocação necessária, perde o encantamento magico do mundo, visto e vivido pelos sujeitos na idade média. Essa mola propulsora do trabalho como uma vocação acarreta necessariamente ao racionalismo econômico, onde como vimos, o racional é movido a fins capitalistas.
 Nos encontramos na próxima resenha de livros, pois Ler é o Caminho!


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